Passagem de bastão aconteceu em Balmoral, na Escócia, onde os dois políticos conservadores se encontraram com a rainha Elizabeth II.
Liz Truss, escolhida pelos filiados do Partido Conservador britânico como sua nova líder, foi formalmente empossada na manhã desta terça-feira como a nova primeira-ministra do Reino Unido. A nova premier foi recebida pela rainha Elizabeth II em Balmoral, na Escócia, pouco após seu antecessor, Boris Johnson, ter uma audiência para entregar a demissão.
As cerimônias começaram cedo no Reino Unido, com o discurso derradeiro de Boris na frente de Downing Street, a sede do governo britânico, por volta das 7h30 (4h30, hora do Brasil). Desafiador, ele lembrou das conquistas nos três anos em que esteve no poder, mas defendeu que a legenda se una ao redor da sucessora.
Em seguida, partiu para Balmoral, onde chegou por volta das 11h15 (7h15, no Brasil) acompanhado de sua mulher, Carrie. Essa é a primeira vez em 70 anos, desde que a monarca foi empossada em 1952, que a transferência formal de poder não ocorre no Palácio de Buckingham, na capital britânica. A rainha passa férias em sua casa de veraneio e, com 96 anos, tem problemas de mobilidade que a vem fazendo cancelar uma série de eventos. A última posse em Balmoral havia sido em 1885.
Veja imagens Liz Truss, nova primeira-ministra do Reino Unido
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Truss fez o mesmo caminho: chegou na Escócia cerca de uma hora após seu antecessor, acompanhada por seu marido, Hugh O’Leary. Foi formalmente empossada pouco depois e já volta para Londres para fazer seu primeiro discurso como premier por volta das 16h (meio-dia no Brasil), em frente à Downing Street — se chover, o discurso será dentro do prédio. Ela será a 15º premier empossada por Elizabeth II. O primeiro foi Winston Churchill.
A nova primeira-ministra será terceira mulher a governar o Reino Unido — as primeiras foram Margaret Thatcher (1979-1990), sua ídola, e Theresa May (2016-2019) — e deve anunciar seu Gabinete assim que retornar à capital britânica. A expectativa é que nenhuma das pastas principais, Chancelaria, Finanças e Assuntos Internos, sejam ocupadas por homens brancos. Na quarta, já terá sua primeira aparição no Parlamento.
— Eu apoiarei Liz Truss e o novo governo por todo o caminho — disse Boris, cercado por apoiadores e parentes, em seu discurso derradeiro.
O premier demissionário listou uma série de conquistas do seu governo: a elogiada campanha de vacinação anti-Covid e o apoio à Ucrânia na invasão russa, por exemplo. Falou também daquilo que chegou ao poder prometendo entregar, e conseguiu, apesar dos impactos que vem se mostrando catastróficos para a economia britânica. A saída britânica da União Europeia, finalizada no ano passado, é o seu maior legado.
Boris permaneceu em silêncio sobre a série de escândalos que, eventualmente, custariam sua cabeça: das festas irregulares no governo durante a quarentena para conter à Covid a denúncias de assédio sexual contra aliados. Caiu no início de junho após a renúncia de 60 integrante dos diferentes escalões do governo em cerce de 48 horas tornar sua permanência insustentável.
— Eles mudam as regras no meio do caminho, mas agora deixa isso para lá — disse o premier demissionário, após comparar a passagem de poder conservadora a um revezamento 4×100, quando os companheiros de time passam o bastão uns para os outros.
Truss foi escolhida líder do Partido Conservador na segunda pelos filiados da sigla, que tiveram cerca de sete semanas para votar nela ou em Rishi Sunak, ex-ministro das Finanças que passou de braço direito a traidor de Boris. Foi seu pedido de demissão que ajudou a catalisar o movimento responsável pela queda do governo, imagem da qual não conseguiu se desvincular durante a campanha.
Se Boris é impopular com os britânicos como um todo, ainda é querido por parte dos quadros do seu partido, principalmente os mais conservadores. Foi deste grupo que Truss conseguiu tirar proveito para se eleger, após optar por permanecer no governo até o fim. A disputa, no entanto, foi feia, e o premier demissionário brincou: se seu cão, Dilyn, e o gato de Downing Street, Larry, puderam superar suas diferenças, o Partido Conservador também poderá.
O premier demissionário disse que é “um desses foguetes de propulsão que cumpriu sua função, e agora reingressará gentilmente na atmosfera e cairá invisivelmente em algum canto remoto do Pacífico. Boris também se comparou com Lúcio Quíncio Cincinato, ditador do século V que salvou Roma de uma invasão e depois retornou para sua fazenda.
De acordo com Boris, os últimos anos foram “tempos difíceis para a economia e para famílias por todo o país. Nós podemos e vamos superar isso. E vamos sair dessa mais fortes”.
Ele disse ainda que o Reino Unido “continuará a ter a força para dar ao povo o dinheiro necessário para atravessar esta crise energética que foi causada pela guerra brutal de Putin”. Referia-se aos controversos planos econômicos de Truss, que aliados conservadores mais ortodoxos caracterizam como “suicídio fiscal”.
Ela promete cortar os impostos e aumentar os investimentos do Estado, o que deve inflar a dívida pública em 60 bilhões de libras (R$ 593 bilhões). O país, contudo, deve entrar em uma recessão ainda este ano e sair só em 2024, prevê o Banco Central da Inglaterra.
Em julho, a variação anual da inflação chegou a dois dígitos, passando de 10%, e o gasto médio anual dos britânicos com as contas domésticas de energia deve pular de cerca de 2 mil libras (R$ 11.878) para 3,5 mil libras (R$ 20.787) em outubro. O jornal Financial Times noticiou que a nova premier cogita congelar o preço da energia ao menos para os mais vulneráveis, iniciativas energéticas que a imprensa estima poderem ultrapassar 100 bilhões de libras (R$ 593 bilhões).
Por O Globo, The New York Times