O decreto também estipula a interoperabilidade, ou seja, a possibilidade de que todos os cartões de empresas de benefícios sejam aceitos em qualquer “maquininha” que opera pagamentos de vale-refeição ou vale-alimentação. Sistemas com mais de 500 mil trabalhadores deverão ser abertos em até 180 dias, segundo o decreto.
A interoperabilidade de benefícios do PAT foi aprovada em lei em 2022 deveria ter entrado em vigor em 2023, mas dependia de regulamentação.
Em até 360 dias, qualquer cartão deverá funcionar em todas as maquininhas de pagamento, com a implantação da interoperabilidade plena entre bandeiras.
O assunto das novas regras do PAT ganhou força no Palácio do Planalto após a crise de preços de alimentos no início do ano, sob o argumento, impulsionado principalmente por Galassi, de que a redução de abusos no mercado de vouchers poderia abrir espaço para conter a inflação nas prateleiras de supermercados e nos cardápios de restaurantes.
A possibilidade de portabilidade do benefício, que daria ao trabalhador o poder de escolher a empresa de vale que deseja usar, também estava prevista pela lei de 2022, mas ficou de fora do decreto assinado por Lula. Hoje, as empresas de VA e VR são contratadas pelo empregador.
Divergências entre empresas
As principais empresas do mercado de vouchers de alimentação estão hoje estruturadas em arranjo fechado: controlam todo o processo, desde o contrato com os empregadores que ofertam vales aos funcionários até o processamento e a liquidação das operações, passando pelo credenciamento dos estabelecimentos, sem a utilização de bandeiras. Novas entrantes operam no arranjo aberto, com a utilização de bandeiras (como Mastercard e Visa) responsáveis pelo credenciamento dos lojistas. Com o decreto, o arranjo aberto passa a ser regra para grandes operadores.
As regras do PAT opõem as maiores empresas do setor, que dominam o mercado, e as chamadas novas entrantes, que operam em esquema de arranjo aberto e defendem maior competição e interoperabilidade, a exemplo de iFood, Caju e Flash.
Como o GLOBO noticiou, o governo chegou a cogitar estipular um prazo de dois dias úteis para a liquidação de pagamentos, mas recuou ante a resistência das principais empresas. O argumento do segmento e de parte dos restaurantes, representados pela Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) era de que o prazo curto inviabilizaria a operação de benefícios a funcionários do setor público, em especial de prefeituras, que têm prazos maiores para a liquidação de pagamentos.
As empresas do setor chegaram a ser convidadas pelo Ministério do Trabalho, entre sexta-feira e sábado, para a cerimônia de assinatura do decreto nesta terça no Planalto, mas foram desconvidadas em seguida, nesta segunda-feira, sob o argumento de que o evento passaria a ser pequeno e mais reservado.
Plataformas comentam
O decreto foi assinado por Lula no Alvorada, em cerimônia reservada. Além do ministro Marinho e de Galassi, participaram os ministros Rui Costa (Casa Civil), Fernando Haddad (Fazenda) e Geraldo Alckmin (Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços).
A plataforma iFood, que opera no mercado de benefícios e pressionava o governo em prol da interoperabilidade e da portabilidade, comemorou a edição das novas regras.
“O iFood celebra a assinatura do decreto que regulamenta novas regras para o vale-refeição e vale-alimentação, e acredita que o governo federal e o Ministério do Trabalho e Emprego dão um passo essencial para a modernização do Programa de Alimentação do Trabalhador. A medida devolve ao PAT o seu propósito de garantir uma alimentação barata e de qualidade para o trabalhador brasileiro, que retorna ao centro da política pública, e assegura um mercado de benefícios justo e aberto, com reflexos positivos para toda a economia”, disse a empresa em nota.
“A redução da taxa cobrada pelas empresas do setor, em harmonia com as regras já vigentes para os cartões de crédito e débito, impactará positivamente milhares de restaurantes e mercados, tornando a alimentação mais acessível para o trabalhador e incentivando a adesão de novos empregadores ao PAT”, prossegue o documento.
“A empresa também considera acertada a definição do regime de operação aberto para grandes arranjos e de interoperabilidade para os menores”, diz o iFood.
Em nota, a Zetta, entidade representante de empresas de tecnologia financeira, inclusive o iFood, manifestou “apoio a iniciativas que busquem a inovação no mercado de benefícios”.
“Assegurar uma competição justa e aberta entre as empresas é um importante passo para a modernização e a descentralização do mercado de benefícios”, diz a nota.
“A associação considera que a abertura do mercado e dos arranjos fechados devolve aos usuários a liberdade para usar o vale-refeição e o vale-alimentação como desejarem, democratizando o mercado de benefícios (…). A mudança também beneficia o mercado de alimentação ao possibilitar que os estabelecimentos aceitem várias bandeiras a partir de uma única credenciadora. O formato aberto amplia a rede credenciada para mais de 3 milhões de estabelecimentos e gera uma economia anual de R$ 5,36 bilhões de reais”, afirma.
Queixa sobre a portabilidade
A associação, contudo, lamentou que a portabilidade não tenha sido regulamentada e diz que “a plena efetivação da portabilidade é elemento crucial e indispensável para a efetiva redução de custos para empresas e, principalmente, para o asseguramento do direito fundamental do trabalhador à livre escolha e à gestão de seus próprios benefícios”.
A Câmara Brasileira de Benefícios ao Trabalhador (CBBT), que representa novas entrantes como Caju, Flash e Swile, diz em nota que as mudanças são “favoráveis ao mercado”.
“As novas medidas, propostas após debate com o setor, devem reduzir as taxas até então praticadas no arranjo fechado e estimular a ampla aceitação dos vales, dando mais poder de escolha em qual restaurante ou supermercado usar os benefícios”.
Para a CBBT, as medidas “são um passo importante para garantir competição justa e o fortalecimento de políticas públicas em prol do trabalhador brasileiro”.
Por : Ivan Martínez-Vargas e Thaís Barcellos — oglobo.globo.com – Brasília